Limo

Quando conseguiu enxugar a mágoa, a vida voltou a fluir.
Que mágoa é água que não leva.
Que mágoa é água que não lava.
Que mágoa é água estagnada.

 - Ana Jácomo

Chimarrão

Amargo doce que eu sorvo
Num beijo em lábios de prata.
Tens o perfume da mata
Molhada pelo sereno.
E a cuia, seio moreno,
Que passa de mão em mão
Traduz, no meu chimarrão,
Em sua simplicidade,
A velha hospitalidade
Da gente do meu rincão.

Trazes à minha lembrança,
Neste teu sabor selvagem,
A mística beberagem,
Do feiticeiro charrua,
E o perfil da lança nua,
Encravada na coxilha,
Apontando firme a trilha,
Por onde rolou a história,
Empoeirada de glórias,
De tradição farroupilha.

Em teus últimos arrancos,
Ao ronco do teu findar,
Ouço um potro a corcovear,
Na imensidão deste pampa,
E em minha mente se estampa,
Reboando nos confins ,
A voz febril dos clarins,
Repinicando: "Avançar"!
E então eu fico a pensar,
Apertando o lábio, assim,
Que o amargo está no fim,
E a seiva forte que eu sinto,
É o sangue de trinta e cinco,
Que volta verde pra mim.

Autoria: Glaucus Saraiva

 

A AMIZADE REAL

Um grande senhor que soubera amontoar sabedoria, além da riqueza, auxiliava diversos amigos pobres, na manutenção do bom ânimo, na luta pela vida. Sentindo-se mais velho chamou o filho à cooperação. O rapaz deveria aprender com ele a distribuir gentilezas e bens.

Para começar, enviou-o à residência de um companheiro de muitos anos, ao qual destinava trezentos cruzeiros mensais. O jovem seguiu-lhe as instruções.

Viajou seis quilômetros e encontrou a casa indicada. Contrariando-lhe a expectativa, porém, não encontrou um pardieiro em ruínas. O domicílio, apesar de modesto, mostrava encanto e conforto. Flores perfumavam o ambiente e alvo linho vestia os móveis com beleza e decência.

O beneficiário de seu pai cumprimentou-o, com alegria efusiva e, depois de inteligente palestra, mandou trazer o café num serviço agradável e distinto. Apresentou-lhe familiares e amigos que se envolviam, felizes, num halo enorme de saúde e contentamento.

Reparando a tranquilidade e a fartura, ali reinantes, o portador regressou ao lar, sem entregar a dádiva.
- Para quê? - confabulava consigo mesmo - aquele homem não era um pedinte. Não parecia guardar problemas que merecessem compaixão e caridade. Certo, o genitor se enganara.

De volta, explicou ao velho pai, particularizadamente, quanto vira, restituindo-lhe a importância de que fora emissário. O ancião, contudo, após ouvi-lo calmamente, retirou mais dinheiro da bolsa, dobrou a quantia e considerou:

- Fizeste bem, tornando até aqui. Ignorava que o nosso amigo estivesse sob mais amplos compromissos. Volta à residência dele e, ao invés de trezentos, entrega-lhe seiscentos cruzeiros, mensalmente, em meu nome, de ora em diante. A sua nova situação reclama recursos duplicados.

- Mas, meu pai - acentuou o moço -, não se trata de pessoa em posição miserável. Ao que suponho, o lar dele possui tanto conforto, quanto o nosso.

- Folgo bastante com a notícia - exclamou o velho.

E, imprimindo terna censura à voz conselheiral, acrescentou:

- Meu filho, se não é lícito dar em dia aos sãos e esmolas aos que não precisam delas, semelhante regra não se aplica aos companheiros que Deus nos confiou. Quem socorre o amigo, apenas nos dias de extremo infortúnio, pode exercer a piedade que humilha ao invés do amor que santifica.

Quem espera o dia do sofrimento para prestar o favor, muita vez não encontrará senão silêncio e morte, perdendo a melhor oportunidade de ser útil. Não devemos exigir que o irmão de jornada se converta em mendigo, a fim de parecermos superiores a ele, em todas as circunstâncias. Tal atitude de nossa parte representaria crueldade e dureza. Estendamos-lhe nossas mãos e façamo-lo subir até nós, para que o nosso concurso não seja orgulho vão.

Toda gente no mundo pode consolar a miséria e partilhar as aflições, mas raros aprendem a acentuar a alegria dos entes amados, multiplicando-a para eles, sem egoísmo e sem inveja no coração.

O amigo verdadeiro, porém, sabe fazer isto. Volta, pois, e atende ao meu conselho para que nossa afeição constitua sementeira de amor para a eternidade.

Nunca desejei improvisar necessitados, em torno de nossa porta e, sim, criar companheiros para sempre. Foi então que o rapaz, envolvido na sabedoria paterna, cumpriu quanto lhe fora determinado, compreendendo a sublime lição de amizade real.

Ditado pelo Espírito Neio Lúcio.
Psicografia de Francisco Cândido Xavier. 
Da obra: Alvorada Cristã.
 
 

Bela filosofia de vida!

É... o inverno já vem chegando!

Versos de Inverno

"Que venha um verso de inverno,
Ressoando longos, na canção mais fria,
E o coração do serrano é mais quente,
Pra enfrentar a invernia."

Cuidando a água do mate me acomodo junto ao fogo
E logo a noite desaba, lá fora só chuva e vento
Passo o braço na guitarra, como se busca uma china
E tapo de rimas brasas, tentando enganar o tempo.

E me atento numa milonga que a noite se alonga
Mateando uma saudade, se esvaiu a tarde
E a chuva não deu trégua e eu légua e légua de canto
Tchê, milonga caborteira sem eira nem beira
Que se achega aos pelegos, trazendo o aconchego
Que me falta ao rancho, quase virado em tapera.

Milonga...
Parceira das longas noites, com mates de espera
Das lidas de campo, das manhãs de geada
Em que se veste de branco, a princesa da serra.
Milonga...
E vem com versos de inverno,
Ressoando longos na canção mais fria
E o coração do serrano é mais quente,
Pra enfrentar a invernia.
 
Grupo Invernia


Inverno

A temperatura está baixa,
o som do vento é agudo em alguns pontos.
Da boca sai uma engraçada fumaça branca,
da coberta sai um calor invisível.

Lá fora chove fino,
o movimento de pessoas é fraco,
a movimentação de carros é contida.
Os galhos das árvores dançam com o vento.

A lareira aqui dentro,
é quentinha como o quê.
O café da manhã reproduz o cheiro ótimo,
do bolo quente e do café passado.

As blusas tomam conta do corpo,
que já está quentinho,
porém ainda preguiçoso.
Os pés estão envoltos por uma grossa meia de lã.

O dia continua arrastado,
quase pedindo clemência,
ou querendo se recolher para dormir,
ou até querendo apenas um copo de café quente,
para se manter lá fora.

O olhar das pessoas continua condizendo...
Sim, frívolo leitor,
condizendo com a estação que imagino agora,
a estação de minha imaginação!

Os gestos são suaves,
a energia é muito poupada.
Livros bons aparecem junto ao sofá e ao edredom,
sem contar nos deliciosos arrepios na nuca,
que vem e vão.

Nenhuma aparência carrancuda,
apenas aparências cansadas e sentidas,
talvez sentidas “daquela cama”.
Pessoas rezando pelo seu rápido retorno ao quente lar.

Agora me vou entrar em outra aventura,
debaixo do meu edredom,
no meu sofá e com minha meia de lã nos pés.
Tomando meu café quentinho,
deleitando-me com o sopro gelado na nuca.

Jonathan Cunha


Fica a dica!!

"Faz o seguinte:
Assopra o pensamento triste,
deixa escorrer a última lágrima,
conta até vinte bem devagarinho...
Abre, então, a janela
aquela que dá para o voo do passarinho
e procura a luz que pisca lá à frente ...
Ao encontrá-la coloca-a dentro do peito,
de tal jeito que possa ser notada do lado de fora...
E acrescenta uma pitada de poesia
do tipo que passa por nós todos os dias, ainda que despercebida...
Aumenta o brilho,
com toda a intensidade de que um sorriso é capaz .
A felicidade é o teu limite e
o paraíso és tu mesmo quem faz..."
(Desconheço o Autor)